“O texto ‘A Lição de Cabo Verde’ é sempre em contraponto com essa Africa que não deu certo. Se há uma parte do continente, como Cabo Verde, que deu certo, porque também é possível a África dar certo”, afirmou a autora, apontando o arquipélago como um exemplo no continente africano, a par de outros países como o Botsuana, o Gana, a África do Sul e as Ilhas Maurícias.
Referindo-se ainda a Cabo Verde, considera que os países não se medem em função do tamanho, mas sim da relação existente entre eleitores e os eleitos e, também, em função dos índices dos indicativos de desenvolvimento das pessoas.
“É isto que é importante o caso de Cabo Verde. Conhecemos a história da independência deste País e sabemos que sectores importantes da sociedade portuguesa eram contra, incluindo o próprio Mário Soares [que foi primeiro-ministro e Presidente da República Portuguesa] e, hoje, este País está a provar ao mundo que a sua independência fez todo o sentido”, enfatizou Moniz em entrevista à Inforpress.
“Em Cabo Verde, há uma democracia saudável em que a alternância se faz de forma pacífica e com eleições regulares e credíveis”, apontou a autora do “Silenciocracia, Jornabófias e Outras Mazelas”, para quem o exemplo dos cabo-verdianos pode ser “replicado em outras paragens, menores ou maiores”.
O livro, explicou Luzia Moniz, é uma compilação de uma serie de crónicas que publica quinzenalmente no semanário Novo Jornal de Angola, onde tem liberdade de escolher os temas sobre os quais pretende “problematizar”.
Confessa que algumas das suas crónicas foram “muito bem aceites”, quer pelos leitores, quer por académicos, sendo que certas delas consubstanciam particularidades “que têm muito a ver com a literatura e, na literatura angolana, há muito disso da criação de palavras e uma delas é a ‘jornabófia’”.
“Jornabófia é um individuo que é jornalista, mas que desempenha funções de bófia. E na sociedade angolana há muito disso. O poder usa o jornalista como bófia, o bufo que faz o serviço de segurança secreta”, indicou Luzia Moniz, acrescentando que usou o termo no sentido pejorativo em relação àqueles que são colocados nas redacções para “espiar e vigiar as conversas entre os colegas, particularmente os que dizem contra o poder político”.
Na sua perspectiva, os “jornabófias” têm igualmente a missão de destratar a oposição, ou seja, a protecção do regime.
A sua crónica sobre os “jornabófias”, conforme disse à Inforpress, baseou-se num facto concreto em Angola em que se descobriu o cartão de “bófia” de um jornalista, que acabou por ficar exposto.
“A partir daí, eu disse: é preciso escrever qualquer coisa para denunciar este tipo de situação”, revelou Luzia Moniz, indicando que começou a nível de um grupo de WhatsApp, do qual faz parte, que a desafiou a pronunciar-se sobre o caso e, numa brincadeira, falou de “jornabófias”, termo que agradou as pessoas.
Segundo ela, a partir daí sentiu-se tentada a escrever um artigo e a definir, na sua perspectiva, o conceito sobre o que é um “jornabófia” e, de seguida, redigiu um outro texto intitulado “Silenciocracia” para, de acordo com as suas palavras, contrapor o que é uma sociedade onde existe mordaça, silêncio, ou seja, censura no computo geral, com uma outra em que prevalece a democracia e a liberdade de expressão.
“A necessidade de escrever um artigo com o título “Silenciocracia” surgiu depois de terem sido massacrados, numa região diamantífera de Angola, Cafunfo, 26 jovens que organizavam uma manifestação para a melhoria das condições de vida das populações”, sublinhou a autora, que lamenta o “silêncio absoluto” do poder que só reagiu mais de um mês depois do acontecimento “para responsabilizar os mortos pela sua morte”.
Na sequencia do incidente de Cafunfo, de acordo com Luzia Moniz, a oposição em Angola convocou uma conferência de imprensa para assumir uma posição única sobre a situação do país, mas este acontecimento foi ignorado pelos órgãos públicos de comunicação social.
“Isto significa que o país vive em silenciocracia, ou seja, quer silenciar vozes que são diferentes da do poder. Isto é uma falta de liberdade”, lamentou, lembrando que o artigo “Silenciocracia” foi motivo de um debate numa universidade moçambicana, além de ter inspirado um académico a escrever um livro baseado na mesma peça.
O livro, cuja apresentação vai estar a cargo da ex-ministra da Justiça de Portugal, Francisca Van-Dunem, ela também uma angolana, divide-se em seis capítulos, a saber: África e Diáspora, Género e Igualdade, Democracia versus Autocracia, Cultura e Identidade, Liberdade de Imprensa e Mazelas de Portugal.
Porque deseja homenagear Cabo Verde, País que ainda não conheceu fisicamente, a autora prometeu apresentar o livro no Centro Cultural de Cabo Verde, em Lisboa
Depois de Portugal, segue-se o lançamento em Angola, prevista para finais de Janeiro, e em Moçambique para 23 de Fevereiro.
Luzia Moniz, uma angolana que escolheu Portugal como sua terra de adopção e opção, é presidente da Plataforma para o Desenvolvimento Africano, definindo-se como uma pan-africanista.
A Semana com Inforpress