“O tema que nós escolhemos para a interpelação ao Governo foi a preparação do ano agrícola e nós chamamos o ministro da Agricultura para nos inteirar do ponto de situação da campanha agrícola e nos apresentar os resultados das medidas anunciadas no ano passado”, disse em conferência de imprensa a porta-voz do grupo parlamentar do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV-oposição), Rosa Rocha, completando que o PAICV sente que “existe uma regressão progressiva da situação no meio rural”.
Prosseguindo, Rosa Rocha disse ser certo que o mundo rural sofreu com a seca, mas, frisou que tem sofrido, particularmente, por “falta de políticas assertivas e incisivas”, passiveis de dar continuidade às políticas desenvolvidas pelo PAICV até 2016, uma vez que, disse, várias medidas “foram descontinuadas” e daí o resultado que se tem neste momento.
“No ano passado previa-se um ano de precipitações acima da média e, entretanto, o Governo não preparou atempadamente o ano agrícola, os agricultores que já estavam descapitalizados devido à seca nos anos anteriores viram-se a braços para conseguir uma boa produção”, disse a deputada.
Rocha acrescentou que “a falta de acesso aos factores como sementes, o Governo não produziu plantas, por exemplo, os viveiros estiveram praticamente vazios, não houve plantas florestais e fruteiras como habitualmente, não houve uma campanha de produção de pasto, as pastagens estão degradadas e não houve investimento do Governo neste sentido”.
Segundo esta deputada, os projectos de ordenamento das bacias hidrográficas estão praticamente suspensos, quando, segundo enfatizou, houve vários estudos de bacias em curso em 2016, havendo neste momento apenas o anúncio da bacia de São João Baptista onde “há três anos que obras vão iniciar e nunca mais iniciam”.
“Das outras bacias hidrográficas em todas as ilhas agrícolas nós não temos notícias. Também nós tivemos um grande incêndio florestal em Serra Malagueta, em que se perdeu grande parte do seu potencial produtivo e precisamos que o Governo nos diga exactamente o que é que está a fazer para repor a capacidade produtiva dos agricultores e criadores que dependem deste perímetro”, realçou.
Rosa Rocha afirmou ainda que o Governo diz ter investido 300 mil contos num programa de crédito agrícola, pelo que o PAICV irá querer saber, nesta primeira sessão de Julho, quais os impactos, que resultados e quantos agricultores foram beneficiados.
“O Governo diz que aumentou a disponibilidade de água, mas ninguém viu onde porque não houve nenhuma campanha de perfuração para aumento da disponibilidade de água. Anuncia a dessalinização de água, mas até este momento nós não vimos nenhum dos sistemas a funcionar, nós queremos saber qual é o ponto da situação. Os agricultores sentem-se abandonados à sua sorte”, queixou.
Rosa Rocha frisou que as delegações do Ministério da Agricultura estão “cada vez mais descapitalizadas” porque os técnicos não sentem motivação para continuar no ministério, citando, por exemplo, a delegação da Ribeira Grande, em Santo Antão, que, conforme disse, este ano já perdeu quatro técnicos e está na iminência de, até o fim do ano, perder mais dois.
“Se nós formos a Porto Novo, a São Nicolau, a São Vicente e mesmo na Ilha de Santiago veremos que os técnicos vão saindo, por reforma ou porque querem aventurar na emigração, tendo em conta que o ministério deixou de implementar programas que davam sentido à sua continuidade e desempenho profissional no Ministério da Agricultura. E com tudo isso são os agricultores que ficam abandonados à sua sorte”, disse.
Segundo Rosa Rocha, a única actividade que o ministério implementa é o sistema de rega gota-a-gota, “uma continuidade a um grande programa que o Governo do PAICV vinha implementando até 2016”, mas que é apenas uma vertente que é importante.
“Deve ser complementada e integrar numa visão global de desenvolvimento do sector agrário que vai desde o aumento da disponibilidade dos factores de produção, melhoria da produção e da produtividade, diversificação da produção, conquista dos mercados, e que deve passar pela conservação e transformação dos produtos e também por um sistema de transporte inter-ilhas que possibilite aceder aos mercados turísticos da ilha do Sal e da Boa Vista que foi suspenso em 2016”, defendeu.
Enquanto isso, denunciou que os centros de produção e transformação de produtos estão “praticamente inactivos”.
“Foram implementados com financiamento externo nas ilhas agrícolas, Santiago, Santo Antão, São Nicolau e Fogo. Estes centros estão inactivos, enquanto isso, os agricultores vêem-se a braços com a sua produção excedentária quando existe a disponibilidade de água para produzir, porque nós sabemos que com a seca há redução de disponibilidade, mas poder-se-ia dar continuidade aos programas de fomento da infiltração e da recarga dos lençóis freáticos como o ordenamento das bacias e mesmo a construção de diques, infra-estruturas e conservação de solos que desde 2016 não sabem onde ficaram. Foram grandes projectos”, defendeu.
Continuando, Rosa Rocha disse que se hoje a produção no mercado é graças a todo o investimento que se fez até 2016, mas que, a partir de lá, há “descontinuidade” e existe uma “regressão clara” do sector rural com impacto na segurança alimentar.
“Não é por acaso que nós temos aumento da insegurança alimentar no País, não apenas porque a situação social degradou, mas porque nós reduzimos a capacidade de produção dos sectores primários como a agricultura e a pecuária, fundamentalmente”, concluiu. A Semana com Inforpress