Mais uma vez o tribunal (foto) da cidade do nordeste português é demandado. As anteriores decisões, do tribunal de Bragança e do Tribunal de Relação de Guimarães, anularam o matrimónio e o testamento relativo a uma fortuna avaliada em dois milhões de euros porque consideraram Marcolino de Jesus, de 101 anos, incapaz — já que nos cinco anos anteriores ao casamento já estava incapaz de manifestar a sua vontade e de gerir a fortuna, como indicou o processo de interdição desencadeado em 2016.
Autores da demanda são três dos quatro filhos do ancião viúvo que casou com a mulher "com idade para ser neta" (foto ao alto, à d.ta), segundo expressou o filho Manuel Marcolino. Filho é também o juiz-desembargador Francisco Marcolino de Jesus, ao centro da foto.
Os três pedem uma indemnização por danos morais no valor de 50 mil euros aos três médicos — dois psiquiatras e um psicólogo punidos disciplinarmente pela emissão de atestados médicos falsos — e à funcionária do Registo Civil de Ribeira da Pena. Esta foi alvo também de um procedimento disciplinar, que foi arquivado, mas o Ministério Público entendeu acusá-la por celebrar o casamento apesar das evidências da incapacidade do centenário.
O casamento foi celebrado em 04 de maio de 2017, numa Conservatória do distrito de Vila Real, 156 quilómetros a oeste de Bragança, distrito e cidade de residência dos nubentes. O ancião de 101 anos e a empregada de 53 anos — que estava na família havia 30 anos — tinham "fugido" para casar.
Poucos dias depois, a 10 de maio, no Cartório Notarial de Vieira do Minho, no distrito de Braga, 200 km a oeste de Bragança, foi lavrado o testamento que beneficiava a mulher em 933 mil euros. Ela recebia um terço da quota disponível da herança, cerca de 667 mil euros, acrescido de um quinto do remanescente.
Marcolino: peripécias extensas
O juiz-desembargador Francisco Marcolino, que aparece desde 2017 como autor de demandas judiciais relativas à herança do pai, tem uma folha extensa nos fait-divers, pelo menos desde 2005 quando foi candidato à câmara de Bragança pelo PS (que perdeu) e processou por difamação e injúrias um grupo de condenados por tráfico de droga. Estes tinham dito que Francisco Marcolino era pessoa das suas relações e um deles teria afirmado ao FBI ao ser detido nos EUA que o juiz português lhes conferiria proteção.
O magistrado ganhou o processo, com os seus difamadores a serem condenados. Contudo, segundo o site especializado ASJJ.pt, um desses narcotraficantes – de nome Duarte ‘Lagarelhos’ – foi sócio da mulher do juiz numa imobiliária de Bragança até 2000, ano em que ela lhe vendeu a sua quota.
Em 2011, o juiz Francisco Marcolino contava, na qualidade de inspetor-judicial, com seis processos em que era queixoso — no que era entendido ser um caso excecional para quem tinha a seu cargo avaliar e fiscalizar o trabalho dos juízes nos tribunais.
Em novembro desse ano, respondeu no CSMJ-Conselho Superior de Magistratura Judicial por mais um processo, em que era arguido e o queixoso era o irmão Amílcar.
Em 2021, o Supremo Tribunal de Justiça de Portugal iniciou na quarta-feira, 3-2-21, o julgamento em que o arguido é o juiz-desembargador e também presidente de Secção Criminal da Relação do Porto. Francisco Marcolino de Jesus restpondeu por difamação contra uma colega a quem insultou via Facebook chamando-a "mentirosa", "desonesta".
Segundo o Jornal de Notícias, o arguido, de 65 anos (foto, ao centro), mantinha com a queixosa, a juiz da comarca de Famalicão Paula Carvalho e Sá, um longo contencioso, por causa de um processo disciplinar que instruiu contra ela, em 2011 quando era inspetor judicial, e que resultou na condenação do Estado português no TEDH-Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (foto, à esqª) — que deu razão à juiz.
Na fase de instrução (preparatória) do julgamento do crime de difamação, em abril de 2019, o (juiz) arguido Francisco de Jesus defendeu que as palavras alegadamente difamatórias tinham sido escritas pela sua mulher. E acrescentou: "Ainda que assim não fosse", "os factos estariam justificados por um interesse legítimo, sendo ainda lícito por decorrerem do exercício da liberdade de expressão".
Esta linha de defesa irritou o juiz de instrução para quem esse tipo de argumentação é "inaceitável, de uma gravidade extrema". Por isso, pronunciou o arguido por um "crime de difamação, com publicidade e agravado", e marcou o julgamento para fevereiro de 2021, quase dois anos depois.
Irmãos em guerra. Amílcar de Jesus, com quem Francisco estava em litígio devido à empresa familiar, acusou o irmão juiz de lhe ter, em 2008, encostado à cabeça uma arma de fogo e ameaçado: "Estouro-te os miolos!".
Tudo começara com uma discussão sobre a alteração do objeto e denominação social da empresa fundada pelo pai e em que os quatro filhos detêm quotas.
Segundo a proposta do juiz, apoiado pelo pai e outros dois irmãos, a Marcolinos, Sociedade Industrial de Estanhos, de exploração de minas e transporte de mercadoria passaria a incluir a designação de "Serviços Aéreos" para poder registar um avião que Francisco Marcolino de Jesus comprara, por 25 mil euros, a meias com o empresário brigantino Horácio Sousa, dono do Intermarché de Bragança e conhecido piloto amador experiente. Horácio Sousa veio a morrer, junto com um jovem piloto da TAP, na queda duma aeronave ultraleve em março de 2019, aos 60 anos.
Fontes: JN/DN/Diário de Trás-Montes/Site institucional. Relacionado: Juiz atribuiu à esposa insulto que ele fez à colega via Facebook, 08.fev.021; Fotos: Um dos filhos do nubente centenário, o desembargador-juiz Francisco Marcolino de Jesus aparece em diversos processos ora como queixoso, ora como denunciado ou arguido. A ex-empregada atacada pelos enteados "alguns com idade para serem pai dela" defendeu-se: "Vou tomar conta do meu marido até ao fim dos seus dias".